de Ernst Lohoff
publicado en Neues Deutschland, 14.03.2008,
Deutsche Version: Zur Analyse der heutigen Gesellschaft ungeeignet
Na década de 1960, a sociologia na Alemanha Ocidental proclamou o “fim das classes” e a transição para uma “sociedade nivelada de camadas médias”. Essa tese tinha como pano de fundo histórico a era de ouro do fordismo, na qual a população trabalhadora também recebeu uma fatia do bolo capitalista. Naquela época, a miséria em massa parecia ter desaparecido de uma vez por todas, pelo menos nos centros do mercado mundial. A ideia de uma “sociedade nivelada de camadas médias” também desempenhou um papel fundamental na disputa ideológica. Era a antítese da afirmação dupla dos marxistas de que ainda havia uma relação antagônica entre capital e trabalho e que o capitalismo pressupunha uma crescente polarização social.
O cenário mudou radicalmente após 40 anos. Sob o novo nome de precarização, o empobrecimento social está voltando aos centros capitalistas e não afeta apenas alguns grupos marginalizados. A opinião pública também está reagindo à crescente desigualdade com considerável atraso e está lamentando a “erosão das camadas médias”. O termo “sociedade de classes”, há muito proscrito, está subitamente se tornando aceitável como um símbolo desse desenvolvimento. O que permanece controverso na teoria de Marx é que ela entendia o capitalismo como uma ordem baseada na exclusão social estrutural. Porém, a ligação entre a teoria da exclusão e o conceito de classe só pode ser compreendida no contexto do século XIX. Ela não é adequada para conceituar analiticamente o sistema de apartheid social que está tomando forma hoje.
A questão social do século XIX foi o resultado da destruição dos modos pré-capitalistas de produção e reprodução e acompanhou a subordinação em larga escala do trabalho vivo à valorização. Os produtores imediatos estavam no centro. Essa fase do desenvolvimento capitalista foi caracterizada pela discriminação e marginalização social dos proprietários da principal força produtiva do capital, os assalariados livres. Foi negado aos proprietários da mercadoria capitalista básica, a força de trabalho, o reconhecimento em pé de igualdade com outros proprietários de mercadorias.
A questão social hoje, por outro lado, tem como pano de fundo a eliminação em massa do trabalho vivo do processo de produção capitalista. Em seu centro está a figura da pessoa supérflua segundo os critérios capitalistas. Em vez da subordinação do trabalho vivo à valorização, trata-se da exclusão social como resultado da desvalorização estrutural em massa da mercadoria força de trabalho. A superexploração generalizada do pessoal assalariado também só pode ser entendida nesse contexto. As condições de venda da força de trabalho se deterioram devido ao seu caráter potencialmente dispensável. Falar sobre o retorno do antagonismo de classe obscurece o fato de que o desenvolvimento atual é essencialmente o resultado de processos de desclassificação.
Mesmo que a classe seja usada hoje de forma vaga e associativa, o termo tem um significado analítico claro. Em vez de grupos de renda arbitrários, ele se refere às categorias funcionais básicas da sociedade capitalista. Nesse sentido preciso, o conceito de classe de modo algum tinha já um significado anticapitalista. Quando Adam Smith transferiu para a sociedade o conceito de classe desenvolvido por Lineu como um esquema de classificação biológica, ele servia para legitimar a estrutura social básica característica do capitalismo. A economia clássica distinguia três fatores de produção que contribuíam igualmente para a produção da riqueza: terra, capital e trabalho; logo, parecia correto e legítimo que os proprietários de terras, capitalistas e operários, como os três portadores indispensáveis da produção de riqueza capitalista, dividissem o resultado entre si na forma da renda da terra, lucro e salários.
Na crítica imanente que Marx fez a essa visão, o conceito de classe recebeu passou por uma reviravolta anticapitalista que ainda tem impacto nos dias de hoje. Marx demonstrou que, embora a riqueza material seja o resultado da combinação da natureza e da atividade humana, a riqueza como valor, e essa é a única coisa que importa no capitalismo, provém exclusivamente do trabalho. Marx transformou o conceito harmonioso de classe em uma teoria de exclusão social estrutural sem questionar o significado de classe como uma categoria funcional capitalista. Tal como Smith, ele via os proprietários de terras e os capitalistas como parte integrante do cosmo capitalista. Marx atribuiu à classe operária o caráter duplo de ser, ao mesmo tempo, parte e oposto da sociedade burguesa.
A posse da mercadoria força de trabalho, que é indispensável para o sistema de valorização do valor, indica os trabalhadores (Arbeiterschaft) como uma classe; no entanto, devido à sua posição supostamente externa-negativa em relação à sociedade burguesa, a atitude da classe proletária deve ter um conteúdo completamente diferente do das outras classes. Enquanto as últimas defendem apenas seus próprios interesses monetários profanos, a principal força produtiva, que é excluída da sociedade burguesa, incorpora o ponto de vista geral da emancipação humana.
O desenvolvimento capitalista negou duas vezes a ligação entre exclusão social e ponto de vista de classe. No século XX, principalmente por meio das lutas do movimento operário, foi alcançado algo que o conceito de classe de Marx havia excluído de modo categórico: a emancipação limitada da classe operária com base nas condições dominantes, a emancipação dos párias proletários em sujeitos livres e iguais do dinheiro. Hoje, a exclusão social está voltando, mas não como exclusão estrutural dos produtores imediatos da riqueza. O trabalho vivo torna-se cada vez mais marginal na produção capitalista de riqueza e isso leva à desclassificação em massa. A crítica de Marx à economia política fornece uma chave para entender essa constelação, mas não é possível lidar com ela usando um ultrapassado conceito enfático de classe.
Tradução: Marcos Barreira