20.05.2025 

Proibição da AfD: já é um começo

por Lothar Galow-Bergemann

Muito obrigado ao Marcos Barreira pela tradução

publicado originalmente em alemão

A memória está desaparecendo novamente. Quando, no ano passado, foram divulgados os planos para a “remigração” de milhões de pessoas, centenas de milhares saíram às ruas contra a extrema direita. Mas foi apenas um breve interlúdio. Como se nada tivesse acontecido, a AfD continua crescendo rapidamente, tem uma grande bancada no Bundestag e alimenta esperanças justificáveis de entrar em breve nos governos estaduais. Não há sinais de que essa tendência possa ser interrompida ou mesmo revertida.

As manifestações foram em vão? Não. Elas deram um sinal de mudança em partes da sociedade. Mas, para poder intervir de forma eficaz na política, é preciso chegar a um consenso sobre uma exigência central, na qual se concentrar. Foi isso que faltou ao movimento da primavera de 2024. Dada a situação atual, essa exigência teria sido a proibição do AfD. Enquanto isso, o movimento perdeu força: no domingo passado, pessoas em todo o país saíram às ruas para exigir a proibição da AfD, mas a participação ficou muito aquém das expectativas dos organizadores: em Heidelberg, cerca de 450 pessoas; em Freiburg, 2.000 em vez das 5.000 esperadas; em Stuttgart, apenas cerca de 200.

A AfD não é de forma alguma a única responsável pela guinada à direita na política e na sociedade. Mas ela é sua ponta de lança. Sua crescente aceitação faz com que as barreiras ainda existentes na política e na sociedade continuem a ruir a cada dia. Em seu rastro, gangues nazistas se tornam mais numerosas, confiantes e agressivas. O número quase incontável de “casos isolados” de incidentes de extrema direita na polícia que vieram a público é apenas a ponta do iceberg. Só agora começa a ficar clara a dimensão do movimento extremista e seus planos de golpe. O misterioso desaparecimento de arsenais da polícia e das Forças Armadas também indica que planos concretos de golpe estão sendo elaborados. Podemos adivinhar a qual partido todos esses atores se sentem ligados. Eles precisam ser desarmados. Só o Estado pode fazer isso e é isso que se deve cobrar dele.

Sempre há uma desculpa

É hora de um golpe administrativo em grande escala contra a AfD. Isso não faria com que as ideias de extrema direita desaparecessem das cabeças das pessoas, mas a infraestrutura e as possibilidades organizacionais do movimento de direita seriam duramente atingidas: fundos públicos, assentos no parlamento, funcionários em tempo integral, estruturas partidárias, contatos com a mídia e, se assim se pode chamar, reputação pública. Uma proibição ou mesmo o simples pedido de proibição ao Tribunal Constitucional Federal, tornaria mais fácil remover extremistas de direita do aparato estatal, especialmente do aparato de segurança.

A exigência de proibir a AfD ganha força com a classificação da agência de segurança interna como “extrema direita comprovada”. Mesmo quem, por boas razões, não simpatiza com essa agência, deve aproveitar essa oportunidade. Pode ser a última.

Não se pode proibir um partido eleito por dez milhões de pessoas? Não são apenas vozes da extrema direita que rejeitam a proibição como “antidemocrática”, mas é justamente a grande popularidade que torna a proibição necessária. Quando o Tribunal Constitucional Federal alemão começou a analisar a proibição do NPD em 2013, considerou o partido anticonstitucional, mas considerou a proibição desproporcional devido à sua insignificância política. O AfD, de extrema direita, tem, por outro lado, uma base de massa. Se agora o contra-argumento é que o partido é politicamente importante demais, então nenhum partido racista e misantropo pode ser proibido e o mecanismo de proteção da democracia previsto na Constituição é inútil.

“Sim, antigamente talvez fosse possível proibi-los”, dizem pessoas que já na época não queriam proibir o AfD. Sempre há uma desculpa pronta. Quando, se não agora?

Apenas uma ação de emergência

Proibir a AfD por conta própria, defendem partes da cena antifa, que não querem depender do Estado na luta contra os nazis. O compromisso é louvável, mas superestima a própria força. Quem mais poderia fazer isso além do Estado?

E se os governantes não quiserem? É bem possível. No entanto, quem não lhes impõe exigências facilita-lhes a vida. Pelo menos, começam a surgir fissuras. Não são poucos, mesmo entre conservadores convictos, os que percebem que a democracia liberal precisa se defender agora, se não quiser renunciar a si própria. Então, o que nos resta senão tentar exercer a máxima pressão social?

Uma proibição não passa de uma ação de emergência. Mas também não é menos do que isso. Novas estruturas de direita se formarão, mas precisarão de tempo para se recuperar do revés. Por outro lado, os movimentos emancipatórios ganhariam um tempo urgentemente necessário. A relação já pode ser sentida hoje: quanto mais livremente a AfD pode agir, mais as coisas ficam difíceis para os projetos emancipatórios, e a sociedade civil fica cada vez mais sob pressão.

O tempo entre um pedido de proibição e uma decisão judicial – provavelmente vários anos – seria um período de intensos conflitos sociais. O caso é que esses conflitos já estão por vir, mesmo sem o pedido de proibição. É claro que a AfD utilizaria todos os meios de propaganda para se vitimizar. Isso faz parte do seu modus operandi. E, naturalmente, a mobilização antifascista também teria que ganhar força. Um movimento social amplo, plural, criativo e duradouro contra a direita e pela proibição da AfD deve acompanhar todo o processo. Já agora, o dano seria grande se o pedido de proibição fosse novamente arquivado. A extrema direita de todos os matizes sairia vitoriosa. É claro que isso ocorreria ainda mais se a decisão fosse a seu favor. Mas não exigir a proibição por isso, nem ao menos tentar, seria suicídio por medo da morte. Além disso, quanto maior a pressão social, maiores as chances de proibição. Mesmo os juízes não estão livres de influências externas.

O problema é a “nossa economia”

O pior de todos os argumentos é que a migração fortalece a AfD. Não se trata disso. Quem a fortalece é a reação à migração: a reação egoísta, misantrópica e racista em massa. É só por isso que a AfD consegue, há anos, mantém todos os demais partidos sob pressão. Esse egoísmo não cai do céu. Ele é parte integrante da “nossa economia”. Quem se impõe no mercado? Eu ou você? Nós ou eles? Do pessoal ao global: concorrência em vez de cooperação.

O que interessa a esta economia é o acesso mundial às matérias-primas, que não interessam à grande maioria das pessoas no mundo. Ninguém defende a lógica brutal deste sistema econômico de forma mais direta do que a AfD. Qualquer um que pense que “nossa economia” e seus princípios são a melhor coisa do mundo só pode se envergonhar ao anunciar que quer lutar politicamente contra a AfD e voltar a reduzi-la ao nada. É o que vemos há anos.

A desintegração do Estado, o domínio de gangues, as guerras, o terror, a fome, a miséria, a falta de perspectivas e a migração em grande parte do mundo também têm a ver com a lógica agressiva dessa economia. Com base nela, nenhum dos grandes desafios pode ser resolvido. As crises só podem se agravar. A proibição da AfD, naturalmente, não é uma solução real. O que realmente ajudaria seria a transição para um tipo de utilização dos recursos compatível com o ser humano e a natureza, cujo princípio básico é a cooperação em vez da concorrência. É ótimo que cada vez mais pessoas não considerem atraente uma economia que exige delas “mais entusiasmo pelo trabalho” e promete uma mini-aposentadoria aos 75 anos. A luta contra a direita deve se aliar ao desejo crescente por uma vida melhor. Quanto maior for essa aliança, maiores serão as chances de sucesso.